Ao longo dos últimos anos, os mecanismos de recuperação judicial em Portugal — como os Processos Especiais de Revitalização (PER) e os Processos Especiais para Acordo de Pagamento (PEAP) — têm sofrido importantes evoluções. Os dados mais recentes da Direção-Geral da Administração da Justiça (DGAJ), divulgados em abril e maio de 2025, permitem-nos traçar um retrato atualizado da sua utilização, duração e eficácia.
PER: menos processos, mais acordos, mas menor representatividade
- No final de 2024, estavam pendentes 240 Processos Especiais de Revitalização, valor que representa uma redução de cerca de 73,8% face a 2013.
- A duração média dos PER findos no último trimestre de 2024 foi de 166 dias, o equivalente a cerca de 5 meses e meio, mantendo-se dentro de um prazo razoável para reestruturações complexas.
- Destaca-se que 51,4% dos PER terminam com acordo celebrado, o que demonstra a relevância deste mecanismo enquanto alternativa viável à insolvência.
- A tendência decrescente do número de PER desde 2015 mantém-se, em grande parte devido à criação do PEAP, que tem vindo a captar parte substancial dos pedidos de reestruturação, especialmente de pessoas singulares.
PEAP: utilização estável, mas com desafios
- Criado em 2017, o PEAP assumiu um papel relevante para devedores particulares e pequenos empresários. No final de 2024, encontravam-se pendentes 161 processos, uma ligeira subida de 1,3% face ao mesmo período de 2023.
- Verificou-se uma redução no número de novas entradas de PEAP no 4.º trimestre de 2024, sinalizando possível retração na procura ou maior recurso a soluções extrajudiciais.
Recuperação de créditos: eficácia continua limitada
Apesar de prazos mais curtos e algum sucesso na celebração de acordos, a taxa global de recuperação de créditos nos processos de reestruturação judicial continua bastante limitada. Em 2024:
- Apenas 6,5% do montante de créditos reconhecidos foi efetivamente recuperado.
- Ou seja, 93,5% dos créditos não foram pagos no âmbito dos processos, o que evidencia uma fragilidade sistémica na proteção dos credores.
Os PER e PEAP continuam a ser instrumentos fundamentais para a reorganização económica de devedores em dificuldades, mas a sua eficácia material, em especial no que toca à proteção dos credores e à viabilidade dos planos aprovados, carece de melhorias estruturais. Entre os caminhos a seguir, destacamos:
- Reforço da mediação pré-judicial com equipas multidisciplinares;
- Avaliação mais rigorosa da viabilidade económica dos planos;
- Acompanhamento pós-processual para prevenir reincidências;
- Formação contínua e especializada dos intervenientes judiciais.
Ângelo Pereira Dias, Administrador Judicial, 25 de maio de 2025